quinta-feira, 2 de junho de 2011

Comentários sobre o Grande Prêmio do Cinema Brasileiro


“Não sei mais o que falar”. Essas foram as palavras de José Padilha, diretor de “Tropa de Elite 2”, ao subir ao palco da cerimônia de entrega do Grande Prêmio do Cinema Brasileiro, na última terça-feira, no teatro João Caetano, pela oitava vez para receber o prêmio de Melhor Diretor. Mal sabia o cineasta, depois de ter feito todos os agradecimentos possíveis, dedicado o prêmio aos 12 milhões de pessoas que foram aos cinemas e esgotado seu estoque de piadinhas, que, cinco minutos depois, ele estaria novamente subindo a escada de acesso ao palco para receber mais um troféu Grande Otelo, dessa vez o último e mais importante o de Melhor Longa de Ficção.

Enquanto “Tropa de Elite 2” praticamente varria o prêmio e abocanhava nove troféus, das 16 indicações que havia recebido, lá estava eu, no segundo andar do teatro, observando as maiores estrelas do cinema nacional desfilarem sob meus olhos. Por isso, faço questão de compartilhar com vocês, adoráveis leitores, os momentos que eu vivi. Justiças, injustiças, críticas, momentos emocionantes e fofocas de bastidores. Tudo está aí embaixo (a lista completa de vencedores você vê no site da Academia Brasileira de Cinema).
José Padilha recebendo o prêmio do voto popular por "Tropa de Elite 2" 

*Importante deixar registrado, antes de tudo, alguns prêmios que a imprensa não dá a devida atenção, mas mesmo assim, acho fundamentais no que tange ao incentivo ao cinema nacional. Afinal de contas, no Brasil não se faz só “Tropa de Elite”. Tem muita gente nova que ama cinema entrando no mercado com ótimas produções e que merecem terem seus filmes apreciados. Portanto, aplausos e recomendações para:
- o ótimo “Geral”, de Anna Azevedo, vencedor do Melhor Curta Documentário, que está no Youtube e todo mundo pode ver e tirar suas próprias conclusões. Eu, um amante inveterado de futebol, me identifiquei muito. Uma singela homenagens aos eternos geraldinos do Maracanã.
- “Dzi Croquettes”, de Tatiana Issa e Raphael Alvarez, vencedor de Melhor Documentário no voto popular. Uma lição de liberdade em tempos de discussão sobre preconceito e homofobia.  
- O infantil “Eu e meu Guarda-Chuva” de Toni Vanzoli, sobre livro do “titã” Branco Mello e deHugo Possolo. Só para mostrar mais uma vez que é possível fazer cinema para crianças com qualidade no Brasil.

*De momentos emocionantes, a noite esteve recheada. O momento surpresa ficou por conta da homenagem à musa Norma Bengell, primeira atriz a interpretar uma cena de nu frontal no cinema. Ela entrou de cadeira de rodas no palco e, na hora de receber os aplausos do público se levantou dizendo: “Há oito anos não saio de casa. Preciso agradecer vocês de pé”. A platéia veio abaixo. Como também veio na hora em que o casal 20 do cinema brasileiro, os produtores Lucy e Luiz Carlos Barreto, subiu para receber o troféu honorário pelos 50 anos de dedicação ao cinema brasileiro.Barretão também protagonizou um dos momentos mais polêmicos da noite em seu discurso, quando praticamente proclamou: “Nos Estados unidos, eles fazem videogame, aqui no Brasil a gente faz cinema humano”. Ao final da premiação, na saída do teatro, cheguei ainda ao seu lado e perguntei como era ser reconhecido depois de tudo que ele já havia feito pelo cinema no Brasil. Sua resposta valeu a noite. “É bom pro ego. Mas Grande Otelo não merecia um troféu assim, é muito feio!”, brincou.

*Agora, as críticas. Confesso que fiquei um pouco decepcionado com a total supremacia de “Tropa de Elite 2”. Não que não tenha achado os principais prêmios merecidos. Sem dúvida alguma, “Tropa 2” foi o grande filme de 2010, afinal nenhum outro provocou tanta discussão, fez tanto barulho e teve tantos espectadores na história do cinema brasileiro quanto a crônica sangrenta da vida real de Padilha. No entanto, acredito que outras produções mereciam ser lembradas em pelo menos algumas categorias. Estou falando especificamente de dois longas, “5X Favela – Agora por nós mesmos” e “Viajo porque preciso, volto porque te amo”. O primeiro pelo trabalho lindo que Cacá Diegues fez com jovens de favelas cariocas. Ia ser, no mínimo, bonito ver esses garotos receberem o prêmio pelo roteiro, feito a mais de 15 mãos. Já o segundo explora um outro caminho, uma outra forma de fazer filme, que ultimamente não vem tendo muito espaço, pelo menos nas bilheterias. Karim Ainouz e Marcelo Gomes fazem um cinema mais contemplativo e menos técnico, que, na minha opinião, também deveria ser valorizado. Afinal, nem só os blockbusters devem ter espaço nas grandes premiações.

* Por último, deixo a parte mais bacana da noite. Meu bate-papo com José Padilha, o grande vencedor da premiação, na saída do teatro. Ele fala sobre seu próximo filme e descarta uma possível continuação da série “Tropa”.

Qual filme você vai dirigir em Hollywood?

Assinei contrato com a MGM e o filme que vou fazer se chama “Robocop”. Já trabalhei o roteiro aqui no Rio e viajo em julho para Los Angeles para começar as filmagens.

Algumas sequências podem ser filmadas no Brasil?

Não estou planejando isso. A história é muito ligada à cidade onde ela se passa, Detroit. Por isso, não há motivo para eu filmar fora. Mas o que posso adiantar é que o filme é uma ficção científica, completamente diferente de “Tropa”.

Há alguma possibilidade de haver um “Tropa 3”?

O filme cumpriu seu papel social. Teve uma bilheteria maravilhosa e gerou a discussão necessária. Mas quero desenvolver outros projetos, fazer coisas diferentes. Já falei o que queria sobre o Brasil, agora quero falar de outros assuntos. Não vai haver um “Tropa 3”.

De acordo com Padilha, Wagner Moura não voltará à pele do já imortalizado Coronel Nascimento


sexta-feira, 27 de maio de 2011

"Sou movido pelo que não conheço"

Nas veias da família Barreto, corre cinema. Quando o então repórter fotográfico Luiz Carlos se casou com Lucy, em 1954, eles não imaginavam que seriam responsáveis, junto com seus filhos Bruno, Fábio e Paula, por grande parte da produção filmográfica do Brasil da segunda metade do século XX. Boa parte dessa trajetória, que tem seu ponto alto no filme “Dona Flor e seus dois maridos”, de 1976,  produzido pela produtora da família, a LC Barreto, foi contada pelo filho mais velho do casal, Bruno, em sua participação no “Depoimentos para a Posteridade”, do Museu da Imagem e do Som, no último dia 19. O diretor foi entrevistado por um time formado por seus próprios pais, pela historiadora Rosa Maria Araújo, pelo produtor Flávio Tambellini e pela atriz Betty Faria. Eu estive lá e ouvi toda a entrevista, que deu origem à matéria que saiu na edição do Jornal Metro Rio do último dia 23.

Glória Pires será a estrela do próximo filme de Bruno, "A arte de perder"

Os melhores momentos do depoimento, em que o cineasta revisitou parte de sua história, incluindo detalhes dos bastidores de sucessos como “A estrela sobe” (1974) e “Romance da empregada” (1987), e revelou novos projetos pode ser conferido em seguida.


Luiz Carlos Barreto: Quais lembranças você tem da sua infância, da nossa casa? E como isso te aproximou do cinema?

Bruno Barreto: Nasci em 17 de março de 1955. Tenho muitas lembranças da infância. Morávamos em uma casa antiga em Botafogo. Na verdade, a casa estava caindo aos pedaços, tinha até vergonha de levar meus amigos lá. Fora isso, lembro que vivia em um ambiente de muita intelectualidade. Circulavam lá em casa Vinicius de Moraes, Baden Powell, Antonio Callado, Helio Pellegrino, Fernando Sabino... Também me lembro do (cineasta) Arnaldo Jabor editando filmes lá em casa. Uma imagem bem clara desse período é o Jabor atacando a geladeira lá de casa. Uma vez ele acabou tomando soda cáustica e ficou cáustico!

Eu era meio distante dos irmãos. Era o primogênito e era um menino meio complicado. Tinha déficit de atenção e tive de trocar de colégio três vezes. lembro que meu pai um dia chegou para mim e disse: "Mas você não quer fazer parte da elite dirigente?" (risos).

Rosa Maria Araújo: Quando você começou a filmar?

Queria ser diretor de fotografia. Meu pai era fotógrafo e eu fotografo desde pequeno. Mas não tinha gosto por dirigir. Comecei a gostar quando fiz meus primeiros curtas. Aí sim me tornei diretor, quando comecei a tomar gosto por contar histórias. Meu primeiro longa foi "Tati, a garota", de 1972. Lembro que minha avó vendeu um apartamento para eu poder ter dinheiro para filmar. Nessa época, queria fima um roteiro original meu, mas meu pai me aconselhou a adaptar alguma obra. Transformei um conto do Aníbal de Machado em roteiro e o filme saiu. Uma curiosidade do filme é que a principal estrela, a Dina Sfat, tem sua voz dublaa por outra atriz, porque como não tinha som direto na época, filmamos com ela e, quando íamos gravar a voz, ela tinha outro compromisso. No fim, nem a mãe dela percebeu que a voz não era da filha.
  
Flávio Tambellini: Qual foi a influência do Cinema Novo no seu trabalho?

Aos dez anos, fui visitar a filmagem de “Terra em Transe”, do Glauber Rocha. Até hoje, é um dos únicos filmes dele que me fascina. Acho que o Cinema Novo se aproximou mais da Nouvelle Vague francesa e eu sempre preferi o Neorrealismo italiano, mais ligado ao mundo e menos ao interior. Nesse aspecto faço uma comparação com o (Pedro) Almodóvar. Ele faz filmes muito pessoais. Sou movido pelo que não conheço. 

RMA: Como você analisa sua obra? Quais são seus melhores filmes?

Já fiz 19 filmes, mais do que o Nelson Pereira dos Santos e do que o Cacá Diegues. Talvez se não tivesse filmado tanto, tinha enlouquecido. O cinema me estabiliza, preciso dele para viver. E se eu pudesse fazer um balanço dos filmes que mais gosto, escolheria “Dona Flor” e “Romance de Empregada” por um motivo: estava muito apaixonado quando filmei esses filmes e isso transpareceu no trabalho. A época do "Dona Flor" foi a melhor da minha vidaEstava apaixonado pela minha ex-mulher, a Suzy Gentil, e minha filha nasceu no mesmo ano. Lembro de vários momentos bons durante as filmagens. O primeiro aconteceu antes delas. Meu pai comprou os direotos da obra de Jorge Amado e queria dar para o Gláuber Rocha fazer um musical. Ele não quis. Acabou que "Dona Flor" caiu no meu colo. Outro momento feliz foi a nascimento da minha filha, que aconteceu quando eu estavafinalizando o som do filme. Saí da maternidade direto para ver como estava a trilha sonora que o Chico Buarque havia feito.

Betty Faria: Sua relação com os atores é muito próxima. Você estuda interpretação?

Nunca estudei interpretação e sei que deveria ter estudado. Mas nesse aspecto sempre fui muito sensitivo e procuro não atrapalhar. Por isso, antes de filmar é fundamental saber escalar, já que uma escalação boa já é 80% do trabalho, e os ensaios, que sempre defendo como melhor forma de chegar ao resultado. Aprendi isso com os fracassos, que sempre me ensinaram mais do que os acertos.

RMA: E quanto aos projetos futuros? O que você está fazendo agora?

Meu próximo filme vai se chamar “A arte de perder”. É um projeto que já tem 15 anos e está em processo de filmagem e financiamento. A Glória Pires está no elenco. Quero contar a história de amor entre a poeta Elizabeth Bishop e a arquiteta Lota de Macedo Soares, que enquanto tiveram um caso de amor,  alcançaram as maiores realizações de suas vidas: Elizabeth ganhou o Pulitzer e Lota projetou o Aterro do Flamengo. Outro projeto é um filme sobre o pianista João Carlos Martins, que vai se chamar “João”. 

RMA: E quanto à sua estreia na TV, filmando dois episódios de "Amor em quatro atos", baseado na obra de Chico Buarque? 

Sempre fui um apaixonado por televisão, queria fazer TV desde a década de 90, quando voltei dos Estados Unidos. A dramaturgia migrou do cinema da televisão. E hoje, acredito que os dois se misturam de certa forma: não é possível fazer um filme de mais de duas horas e meia, as produções estão se encurtando. Por isso, tentar expandir o formato do cinema para a TV é uma boa saída para a maioria dos diretores, que, além de poderem explorar uma outra linguagem, conseguem alcançar um número maior de espectadores.

quarta-feira, 25 de maio de 2011

Luxo e lixo

Sei que a dica está mais do que atrasada. Mas como o blogueiro também estava, o atraso se explica, mas definitivamente não se justifica. Ainda não consegui encontrar desculpas para meu atraso de quase um ano com “Lixo Extraordinário”. Com certeza não foi por falta de informação, afinal a co-produção britânico-brasileira andou freqüentando com – merecida – assiduidade as manchetes e acabou por elevar a condição de celebridade o líder da categoria dos catadores de lixo de Jardim Gramacho, Tião Santos. Nem tampouco por falta de referências. O prêmio de melhor documentário em Sundance e a indicação ao Oscar já dispensam maiores comentários.

Tenho um palpite: talvez a presença de Vik Muniz como personagem central tenha sido um dos motivos de meu preconceito. Até porque, por vezes, sua genialidade – que admiro e reconheço – soa um tanto quanto presunçosa e publicitária. Por isso, no meu primeiro contato com o filme, através de trailers e cartazes, pareceu-me que se tratava de um arroubo de autopromoção do artista. No final de contas, percebi que tudo foi uma grande besteira. Deveria ter visto o filme antes.

Com um ano de atraso, o que mais me impressionou foi a grande virada que se dá no desenrolar da história. Enquanto no início, o filme parece narrar mais uma das aventuras de Vik Muniz – dessa vez, o artista, procura dar sentido a sua arte mudando a realidade de catadores de lixo do aterro sanitário de Jardim Gramacho, no Rio de Janeiro – de repente o espectador se vê envolvido pela história de vida de personagens fantásticos, que acabam tendo suas histórias de vida expostas na narrativa. Esse é o grande acerto da produção: conseguiu encontrar boas histórias. E boas histórias conseguem sustentar qualquer filme – contato que tenham uma boa direção e, no caso o trabalho de câmera de Lucy Walker, João Jardim e Karen Harley é primoroso.

Imagem feita a partir de lixo do catador Tião Santos

Da ingenuidade cômica e inteligente de Seu Valter à força contestadora de Tião, o que o espectador vê diante de seus olhos é uma transformação. Enquanto, no início, os catadores de lixo parecem até fazer parte da paisagem, no fim, elas são gente. E é dessa identificação que vem a grande lição do filme, simbolizada pela frase da personagem Irmã, na estreia da exposição de Vik no Museu de Arte Moderno do Rio. Ela nunca tinha entrado em um museu e um retrato seu feito com lixo do aterro sanitário era um dos grandes destaques da mostra, elogiada por críticos de todo mundo. “Às vezes a gente se põe tão pequeno e as pessoas lá fora acham a gente tão grande, tão bonito”, diz a cozinheira, acanhada, cercada por microfones. O choque de realidade é tão duro que é impossível passar indiferente pelo filme. Recomendo a experiência e a reflexão.

sábado, 14 de maio de 2011

Ela tá em todas!

Fabíula Nascimento é mesmo um fenômeno. A curitibana, de 32 anos, é uma das mais gratas revelações do cinema nacional da década. Em 2011, ela está vivendo um momento especial na carreira: até o fim do ano vai estar em cartaz em cinco filmes. Nessa entrevista que fiz com ela, publicada no Jornal Metro do dia 5 de maio, por ocasião do lançamento de “Não se pode viver sem amor”, do diretor Jorge Durán, em que ela interpreta a bailarina Gilda, ela fala sobre seus personagens, o sucesso dos filmes e planos para o futuro. Até gostaria que ela falasse um pouco de sua vida pessoal, do término do casamento com o também ator Alexandre Nero, mas ela, de uma forma muito simpática até, preferiu não falar sobre o assunto. Sem problemas.

Até o fim de 2011 você vai ter estrelado cinco filmes, “Bruna Surfistinha”, “Amor?”, “Não se pode viver sem amor”, “Dores de Amores” e “Cilada.com”. Como é a sua relação com o cinema?

Isso é engraçado, porque no meio do cinema, principalmento o feito no Brasil, a dificuldade para lançar um filme é enorme. E, muitas vezes, um diretor demora três, quatro anos para lançar. É isso o que está acontecendo agora. Fiz todos esses filmes em momentos diferentes, de 2008 para cá, mas todos estão sendo lançados ao mesmo tempo, então as pessoas acham que filmei todos ao mesmo tempo, mas não foi assim.
Quanto a minha relação com o cinema, acho que ela é especial. Comecei no teatro, em Curitiba. Só em 2008, fiz meu primeiro filme, “Estômago”. A partir daí me apaixonei pelo processo, pelo resultado, pelo dia a dia. Fazer cinema é uma delícia.

Esse ano você ainda volta aos palcos e à TV?

Estou terminando uma temporada no teatro com o Marcius Melhem e, até o final do ano, não sei se vou ter tempo para entrar em cartaz de novo. Mas vou voltar à Tv com dois seriados que já fazia ano passado: o “Junto e Misturado” e o “Força Tarefa”, na Globo.  

Como você encara o reconhecimento do público, depois de tantos trabalhos bem sucedidos?

Acho que o reconhecimento vem mais do meio artístico. O cinema, principalmente, vem abrindo várias portas poara mim. Estou sendo chamada para fazer vários outros filmes. Minha relação com o público é engraçada: muitas vezes eles não sabem meu nome, mas sabem que eu existo.

Seu primeiro papel de grande porte foi em “Estômago”, em que você interpretava uma prostituta. Depois você ainda interpretou a Janine em “Bruna Surfistinha” e, agora, você está na pele da Gilda, uma outra prostituta, em “Não se pode viver sem amor”. Como é fazer esse tipo de papel?

Os três foram papéis bastante diferentes um dos outro. A Íria, de “Estômago”, é mais lúdica, o (diretor) Marcos Jorge tinha a intenção de fazer uma fábula gastronômica e a personagem tinha que ser cômica e ao mesmo tempo, rechonchuda e leve. Já a Janine, de “Bruna”, é mais “vida real” sabe. É um tipo bem mais próximo da realidade do que as outras duas. E a Gilda, do (Jorge) Durán, é mais lírica, tanto que, no filme, não mencionamos a palavra prostituta, ela é mais uma dançarina.

Você acredita no amor como sentido da vida, como passa a mensagem do filme do Jorge Durán?

Acredito, acima de tudo, no amor. Não só no amor carnal, homem-mulher. Pode ser por algo, alguém. O amor, como um todo, dá uma motivação para a vida. Uma vntade de viver. O filme reflete muito bem essa opinião. 

Até o fim de 2011, Fabíula vai estrelar cinco produções

Você começou a chamar atenção, no início da carreira, por papeis cômicos. Agora estamos começando a ver personagens suas em situações dramáticas. Existe alguma diferença na preparação? Como você encara essa dicotomia?

Com certeza, existe uma diferença em como vou representar o papel. Mas eu não me vejo como uma atriz cômica ou dramática. Me divirto representando, é isso que sinto prazer em fazer, desde que fazia teatro, em Curitiba. Não tenho preconceitos e ainda pretendo explorar outras vertentes.

Uma curiosidade: é verdade que, em Curitiba, sua cidade natal, você era cabeleireira? Como se deu a transição para o teatro e daí para o cinema?

Minha família sempre teve comércio em Curitiba. Antes de terminar a escola, fiz curso técnico de cabeleireira, junto com a minha mãe, e abrimos um salão. Ele durou dois anos, até 2006, quando comecei os testes para “Estômago”. Mas até hoje, quando dá vontade, corto meu cabelo.
Comecei no teatro com uma peça infantil, Cinderela. Eu fazia um dos ratinhos, esse foi o primeiro papel da minha carreira. Depois, continuei no teatro infantil, até que o Marcos Jorge me viu atuando e chamou para fazer testes para “Estômago”. Acabou que, graças ao meu jeito de dançar, fui escolhida para o papel.

domingo, 8 de maio de 2011

Um pouco de sonho faz bem


Já era hora de o fantástico ter um pouco de espaço no cinema brasileiro. O hiperrealismo de produções como Tropa de Elite ou Cidade de Deus, que tiveram forte apelo perante a mídia e a própria crítica, acabou fechando as portas para ou até desestimulando a criação de filmes um poucos mais ousados, do ponto de vista estético, e inusitados, falando do roteiro. Não estou condenando esse tipo de filme, até porque os considero, muitas vezes, retrato de nossa sociedade atual, em choque perante tantos casos de violência e escândalos de corrupção.

Cauã Reymond está bem no papel de João, um jovem desiludido com a vida

A vida real brasileira é rica em temas para serem desenvolvidos nas telas. E isso não é algo a ser condenado. Pelo contrário, a reflexão gerada por esses filmes acaba provocando debates que ajudam na resolução de muitos dos problemas que enfrentamos. Contudo, às vezes recorrer ao sonho é uma boa saída para esse choque de realidade.

Em “Não se pode viver sem amor”, em cartaz desde a última sexta, o chileno Jorge Durán (que já assinu o roteiro de “Pixote – A lei do mais fraco”) consegue lidar de forma brilhante com essa dicotomia. O diretor, que adotou o Rio como sua cidade há mais de 30 anos, consegue derramar poesia sobre os paralelepípedos do Centro da cidade e constrói um mosaico de relações onde a fuga para o fantástico acaba sendo a saída para as ausências e necessidades reais. Com a ajuda de um roteiro afiado e superando problemas – comuns para produções nacionais – como a falta de verba, Durán consegue costurar uma trama bem amarrada, em que os personagens, como em uma ciranda encantada, dançam a procura de um par, de alguém que falta, do amor que um dia se perdeu. E quando tudo parece perdido e não parece haver mais saída na luta contra a solidão, resta ao sonho botar ordem na realidade e construir um novo mundo real.

O roteiro se divide em dois núcleos que se fundem no desenrolar da história. Na véspera do Natal, Roseli (Simone Spoladore, ótima, Melhor Atriz do Festival de Gramado pelo papel) e seu filho Gabriel (o estreante Victor Mott, um pouco inseguro, mas mesmo assim eficiente e promissor), saem do interior para o Rio em busca do pai dele, que os abandonou. No outro extremo está Pedro (Angelo Antônio), professor universitário, que se acaba tendo seu caminho cruzado por João (Cauã Reymond), um jovem desempregado, que se desespera por não conseguir concretizar sua paixão pela desiludida dançarina Gilda (Fabíula Nascimento, como sempre maravilhosa, dessa vez em um papel diferente dos últimos que interpretou, mais lírico do que cômico). É a partir dos encontros e desencontros dessa teia de personagens que o sonho acaba se impregnando na narrativa e influenciando a realidade.


Apesar de não ser veiculado em circuito convencional e não ser um filme de fácil digamos, digestão, recomendo a tentativa. Afinal, nada melhor do que o sonho para curar um pouco a ressaca da realidade.